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   Desde que conheço por gente, nunca me dei bem com minha mãe... Costumo pensar que eu tinha mais medo do que respeito com ela... O dia que ela ficasse brava, poderia decretar: acabou o dia dentro de casa... Poderia estar chateada comigo, com minha irmã ou o meu pai, não importava... Com ela brava, a casa ficava com um ar cinzento...
   Já aguentei dela muitas humilhações. Ela podia dizer tranquilamente  que um vestido em mim ficara tão bem quanto numa grávida, de tão gorda que estava. Ah! E sempre me culpava por ela ser gorda. Dizia que engordava por me ver engordar. As pessoas poderiam me dizer que eu estava mais magrinha, mas ela sempre diria: "eles dizem isso para te agradar. Você continua gorda."
   Na minha adolescência não foi diferente. Lembro-me até hoje de um castigo ganho indevidamente... Minha colega do primário namorava um cara (nem lembro o nome dele). Ela só podia sair comigo. Então, ambas mentíamos para nossas mães de que íamos sozinhas ao cinema. Naquela época (anos 80), a palavra ficar só ia aparecer mesmo alguns anos depois... Era moda entre os adolescentes irmos ao cinema prá namorar: que consistia em beijos e abraços... Nem mão boba existia... Pelo menos, assim minhas amigas que namoravam no cinema assim me contavam... Eu nunca namorei no cinema... Como ela não queria me deixar de vela, teve a infeliz idéia de pedir ao namorado que chamasse um amigo dele para me acompanhar. O nome dele era André. Era baixinho, tinha olhos verdes... Não era feio, mas naquela época, eu era completamente apaixonada pelo Fábio, meu colega. Não tinha olhos para mais ninguém...
   Íamos sempre ao Shopping Mappin (naquela época era só Mappin mesmo). Cinema-Burger: sempre nesse esquema... André sempre tentava me conquistar, conversando, pagando pipoca prá mim, mas eu não queria absolutamente nada com ele... Com isso, literalmente assistíamos os filmes, calados...
   Isso foi acontecendo por 3 saídas, acho... Até que, ao saírmos do cinema, demos de cara com minha mãe, meu pai e minha irmã. Rapidamente pedimos aos moços que se afastassem de nós mas era tarde... André nem sequer me abraçava, pegava na minha mão ou encostava em mim... Mas para minha mãe, eu estava com ele...
   Ao chegar em casa, ouvi de tudo, fui acusada de tudo... Naquela época dificilmente me defendia, como eu disse, tinha medo dela... Tinha medo de apanhar mais... Um mês proibida de sair.
   No colégio, sofria retaliações de colegas. Acho que elas se aproveitavam de mim por eu não reagir. Engolia quieta quaisquer brincadeiras de mau-gosto. Cheguei a contar uma vez para minha mãe. "Você deve ter feito alguma coisa para que elas fizessem isso com você", foi o que ela me disse.
   A partir desse dia, nunca mais comentei nada... Para que? Ela não acreditava em mim que aquilo era gratuito...
    Até o dia em que quase queimaram minha mochila...
    Minha reação? Fui correndo para um banheiro sentar num canto e chorar... Chorei muito, solucei de verdade... Não conseguia entender porque aquilo acontecia comigo... Estava crente que nos próximos anos aguentaria aquilo por muitas vezes... Eu tinha medo... Minha amiga Renata, que me viu ao longe, logo percebeu que algo acontecera... Veio até mim, ficou uma fera quando percebeu o que tinha acontecido. Chamou a conselheira e foi feita uma reunião naquele dia com as que me fizeram tamanha barbaridade... Estava sozinha ao lado da conselheira e aproximadamente 4 ou 5 garotas na nossa frente, rindo da minha cara... Uma das minhas piores humilhações...
   Minha amiga Renata me levou prá casa. Eu estava completamente nervosa... Tremia, lagrimejava demais... Foi a primeira vez que tomei um copo de Maracugina. Estava com a cabeça doendo... Estava muito triste... A mãe da minha amiga me abraçou e me disse que tudo ficaria bem... Era hora de ligar para o meu pai, mas foi apenas começar a falar, eu chorava de novo... Então minha amiga falou com ele... Ele veio me buscar, mas durante o caminho não teve a menor paciência de me ouvir, pois ao tentar contar soluçava demais, chorava demais... Cheguei em casa e depois de ter contado o que houve, disse que no dia seguinte havia uma nova reunião com essas colegas com a conselheira. A resposta não poderia ser diferente: "Vou lá para saber o que aconteceu, não para te defender." Aquilo me doeu... Nunca tinha dado nenhum tipo de problemas de brigas para minha mãe... Por que ela me tratava como se eu fosse uma delinquente?
    Liguei para a Renata e contei o que minha mãe tinha dito.... Renata convocou nossas amigas para testemunhar a meu favor... Foi só ali que minha mãe acreditou em mim...

    A partir disso, sempre tentei sozinha, resolver meus probleminhas...
   Ao morar em outro país para estudar, no primeiro ano, uma vez chorei ao meu pai pelo telefone que me sentia muito sozinha depois de ter brigado com uma amiga... Sua resposta: você está aí prá estudar...
    Sempre tinha minhas crises de choro, depressão...  Foram 7 anos aprendendo a conviver com os únicos melhores amigos que teria: Deus e eu mesma... Amigas até diziam que dificilmente eu mostrava tristeza. Aprendi a ser palhaça, hilariante, falar besteiras... Isso conquistou muitos amigos.
     Voltei para minha casa em 2008... o pior ano da minha vida, eu diria. Tinha que estudar para a prova do CRM, não tinha amigas com quem conversar, era controlada pelos meus pais o tempo todo. Não tinha vontade de estudar. Já tinha 30 anos, mas me tratavam como se tivesse 15.
   O dia em que meu colega me ligou do Paraguai para me avisar que tinha em suas mãos o nosso diploma, ao desligar, passei minha mão ao meu pai para um aperto de mãos, sorridente, dizendo-lhe que naquele momento ele podia me chamar de colega. Ele me olhou e disse: "você só vai ser minha colega quando pegar o CRM." 
   Me sentia frustrada. Quis buscar um consolo na minha irmã menor... Ledo engano... Até mesmo ela me tratava como uma adolescente idiota. Nunca vou esquecer uma triste vez em que meus pais iam viajar. Ela literalmente me ameaçou de que se eu trouxesse algum homem para a casa, ela contaria aos meus pais... Fiquei chocada...
   No segundo ano que fiz a prova do CRM, o verdadeiro abraço de boa sorte não veio de nenhum deles... Eles estavam indo viajar para MG e passaram o dia inteiro estressados com isso. Fui para o aeroporto de Guarulhos para pegar o avião para Cuiabá- MT, onde faria a prova. Nenhum deles ficou comigo até eu entrar no portão de embarque. Quando entrei no saguão de embarque,fui recebida com um abraço de boa sorte e a frase "Eu sei que você vai voltar aqui com boas notícias" de um grande amigo. Aliás, se não fosse por ele, não sei se ia mesmo conseguir... Ele me tranquilizou. Me deu esperanças. Pelo menos alguém estava acreditando em mim.

   Toda essa sensação horrorosa de solidão dentro de uma casa com 4 pessoas tinha sumido quando consegui meu CRM e trabalhar. Costumo dizer que meu CRM foi o divisor de águas na minha vida. Me sentia livre, trabalhava, gostavam do meu trabalho, me senti querida, requisitada... Minha fisionomia mudara...
   Mas essa sensação está voltando... Sinto que minha mãe não me suporta mais aqui. Sinto que sou novamente o peso, a pedra no sapato dela. Infelizmente, eu comecei agora a pagar meu apartamento... Faltam ainda 2 anos para ele ficar pronto. Comprei na planta... Não tenho como alugar um apartamento... Sinto que estou sobrando aqui...
   Por morar sozinha, aprendi também a ser respondona... Minha mãe sempre teve o direito de falar o que quisesse, por mais medonhas e duras que fossem suas palavras... Ela sempre foi ácida, mas ninguém podia dizer-lhe verdades. Principalmente sobre sua intocável família. Ao apontar um defeito deles, me chamou de falsa (???). E não falou comigo por dias...
  E hoje? Estou há três dias com uma tosse horrorosa que está me produzindo dores de cabeça, dores no corpo, febre. Comi feito um passarinho no almoço. Desci agora para tomar um café. Tinha fome. Meu pai tinha chegado do trabalho. Ela tinha me pedido para preparar a mesa pro meu pai. Confesso que ia fazê-lo, mas demorei. Estava prestando atenção na televisão. Foi quando ela veio à cozinha e falou um monte. Levantei-me para fazer. Minha mãe respondeu: "não precisa mais", tal como menina mimada... E começou a ladainha sobre como sou desconsiderada, má filha, etc...
   É nessas horas que paro e penso que estou tempo demais nesta casa. Não tenho porque aguentar certas coisas...
   Cada vez que vou sair, ela sempre pensa que vou dar prá alguém. Sempre que alguém me liga e eu dou risada com essa amiga no telefone, ela me acusa que sou só assim com meus amigos... Isso quando não me perguntam quem me ligou. Affe...
   Saio muito pouco. Não tenho namorado, nem sequer muitos amigos... Sou muito sozinha, mas me aguento de boa assim... Gostaria que me respeitassem mais...
   Não quero voltar naquele miserável ano de 2008, onde pensei até mesmo em voltar para o Paraguai e trabalhar por lá, de tão frustrada que me sentia...
   Posso não ter sido a filha exemplar, mas tem certas coisas que sei bem que não mereço mais. Nunca cheguei bêbada em casa, nunca consumi nem sequer um cigarro. Nunca tive um namorado sanguessuga ou alguém que os preocupasse. Meu único e grande problema que considero até hoje é minha gordura. Até disso estou tentando resolver... Sem reclamar, sem encher o saco de ninguém... No meu ritmo... E minhas pequenas conquistas agora as guardo prá mim, já que não tenho de verdade alguém nesta casa que me diga pelo menos um "parabéns".
   Comprei eu mesma meu anel de formatura. Meus pais jamais quiseram me comprar um. Diziam que eu não merecia... Mas eu merecia sim. Eu estudei, ralei prá chegar onde estou... Continuo ralando. Considero meu anel minha maior relíquia. Um carinho para mim mesma. Um reconhecimento pelo que fiz para chegar onde estou.
   Gosto dos meus pais. E minha irmã. Eu os amo, mas odeio que me façam sentir como uma idiota. Eles não sabem como me sinto, pois decidi que não vale a pena desabafar com eles.
    Há muito tempo não chorava por algo assim... se bem que estou no meu ciclo menstrual... Pode ser isso...  Mas é horrível relembrar tantas coisas feias que passei... Deus queira que tudo se resolva da melhor forma, sem incomodar ninguém... Não quero mais me sentir frustrada como antes... Não posso. Tenho muito a fazer...

   Bem, é isso... Um desabafo de uma mulher doente... rsrs... Até...

Lizlica

1 comentários:

Personalidade Forte disse...

Liz,to em choque com seu relato.
Na verdade eu já sabia de tudo,mas é revoltante.
Me perdoe pelo que vou dizer.
Mas sua mãe não merece vc como filha.Ao contrário, merece uma filha má,ingrata.
Entendo perfeitamente vc,pois passei por situações semelhantes,sempre pensei que quando minha mãe morresse não iria sentir,e o pior,que nunca ligaria ou choraria,mas as coisas mudam.
Sinceramente,eu concordo com vc,acredito que sua mãe queira vc longe daí.
Saia, mude para algum lugar simples,um apt pequeno,de aluguel que dê para você pagar,vc não irá passar fome,economize um pouco aqui e ali,e saia dai,não se destrua Liz.
Não deixe que a tristeza tome conta de você,que seu sorriso mude por lágrimas.
To triste viu,me sentindo impotente, queria poder fazer algo,pois sei o quanto vc é especial e merece o melhor.
Faça algo,vc é superior a isso,já é independente,vá viver sua vida sem as pertubações de sua mãe.
Lute,pare e pense um pouco.
Se eu puder fazer algo,estou aqui...longe,mas sempre estarei.
Te adoro de coração.
Beijos.
Márcia Fernandes.